MotoGP à Lupa, 2020: 10 – A telemetria

Por a 16 Dezembro 2020 17:00

A telemetria pode ser definida como o conjunto de equipamentos que recolhe e regista inúmeros dados a bordo de uma máquina de competição

“A telemetria permite-nos agora fazer em minutos o que antes levaria dias!” Guy Coulon, Tech3

No caso da MotoGP, são cerca de 36 sensores que recolhem tudo desde movimento da suspensão à reação do chassis a esta, inclinação, grau de aceleração e posição das borboletas da injecção, a qualquer qualquer altura no circuito. Também as forças giroscópicas de que já falámos, velocidade, momento e forças de travagem, aderência ou derrapagem dos pneus, temperaturas e pressões de ar várias e muitos outros parâmetros.

De começos tímidos no início dos anos 90, quando um pequeno módulo registava algumas variáveis como movimento da suspensão e regime motor, que depois tinham que ser descarregados ligando o computador à moto, as ligações atuais permitem saber tudo que está acontecer numa moto e comparar quase imediatamente no ecrã com, por exemplo, os dados semelhares do segundo piloto, e assim permitir vários acertos e leituras.

Uma delas, desde logo, é confirmar as impressões do piloto dando à equipa uma noção muito rigorosa de até que ponto ele está a dizer a verdade e a entender a moto, o outro é apontar para zonas na condução que podem ser melhoradas, áreas em que nitidamente o piloto poderia, por exemplo, acelerar mais cedo, ou pelo contrário, deveria manter o regime mais contido para a seguir ganhar mais velocidade.

Tudo isto pode ser traduzido em gráficos que ilustram imediatamente as várias variáveis e o jogo de todos os sistemas na moto através de uma volta rápida.

Outra aplicação de telemetria que exibe a tecnologia moderna são os incríveis gráficos das quedas registados pelos fatos airbag da Alpine Stars ou Dainese, com as próprias marcas a mostrarem por vezes o que acontece enquanto o piloto voa pelos ares, o airbag entra em ação e depois a fase de aterragem, tudo a ocorrer em centésimas de segundo mas claramente ilustrado em detalhe na telemetria.

Basicamente como dizia Guy Coulon da Tech 3 há algum tempo, “a telemetria permite-nos agora fazer em minutos o que levaria dias de treinos a testar diferentes parâmetros sistematicamente! Agora vemos exatamente o que está acontecer, e comparando com o modelo do computador, podemos prever o comportamento quando se altera uma das variáveis o que antes seria impossível.”

Ligados a um simples PC, os dados recolhidos podem ser tratados com visualização em tempo real, com uma volta de referência para comparação, ou por justaposição de voltas múltiplas para avaliar o progresso do piloto.

Uma das empresas à frente da tecnologia de telemetria é a Italiana Dell’Orto, que fornece todos os sensores para as categorias de MotoE e Moto3,

Na MotoGP a tecnologia da empresa alemã 2D, extensivamente utilizada na competição automóvel, é a utilizada, pois providência um tal número de possíveis parâmetros que, na realidade, numa moto, apenas uma pequena quantidade das possibilidades são utilizadas.

Através de 104 canais de telemetria, o mapa vetorial do circuito pode ser usado para observar a cronometragem, com análise de sectores, tempo crítico e volta ideal com referência à volta mais rápida, além de captura de vídeo.

Uma variedade de estilos de display pode ser seleccionada, tudo isto apenas num simples ambiente Microsoft com a partir de 2 GB e apenas 50 Megas de espaço no disco rígido.

Com aquisição de dados por Wi-Fi ou Ethernet e ligação à internet todos possíveis, um pequeno Datalogger da 2D, que mede 90 por 76 mm com apenas 26 mm de altura (o tamanho de um maço de tabaco) grava a um ritmo de amostragem de 25,6  seis kilobites, com quatro Gigas de memória interna, quatro interfaces CanBus, duas interfaces de internet de 100 megabits, duas saídas USB e uma interface com a possibilidade de receber sensores de 12 V ou 5 V.

Os dados são também ligados ao GPS para relacionar o comportamento com qualquer ponto da pista, embora isso já não posso ser usado para fazer mudanças em tempo real desde 2016.

Os sensores da 2D também fazem interface com a ECU de controlo Magneti Marelli e dela tiram todos os dados de comportamento do motor, como regime, posição do acelerador, atitude das borboletas, movimento da mão do piloto, pressão de admissão, temperaturas e velocidade de admissão no motor etc.

Outro dado importante são as leituras dos controlos de tração, mostrando a que grau de inclinação, velocidade e abertura do acelerador o pneu começa a derrapar o que permite, portanto, afinar tudo ao mínimo pormenor.

30 sensores análogos, incluindo quatro monitores de temperatura, níveis de oxigénio, leituras de gás da sonda Lambda e muitos outros sensores digitais medem tudo o que se desejar.

Até os tempos de corte de ignição do Quickshifter são idealizados por amostragem de dados recolhidos pela telemetria para otimizar a interferência do sistema.

O melhor disto tudo, claro, é que fica tudo registado para posterior análise.

Os dados podem ser depois comparados minuciosamente, não só corrida a corrida, mas quase curva a curva.

Cada vez mais, a interação entre os módulos de comando da Magneti Marelli com os sistemas de recolha de dados da 2D tem vindo a ser aperfeiçoada para ambos trabalharem em conjunção em milissegundos.

Outra importante leitura são as medidas das forças giroscópicas de que já falámos também, com seis parâmetros monitorados através de três giroscópios axiais que lidam portanto com as diferentes direcções de movimento, e três acelerómetros para lidar com a razão de mudança de velocidade, a aceleração e travagem.

Outros parâmetros registados são as temperaturas dos pneus e os dados dos potenciómetros que medem o afundamento da suspensão e pressão exercida nos travões e, claro, qualquer coisa que se faça no sistema de ride-by-wire do acelerador.

No meio disto tudo, o mais imprevisível, e a única coisa que não pode propriamente ser medida com sensores, são as emoções e reações do piloto… por isso é que conjugar ambos estes factores, o técnico e o humano, continua a ser talvez o maior desafio no MotoGP!

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Paulo Araújo
Jornalista especialista de velocidade, MotoGP e SBK com mais de 36 anos de atividade, incluindo Imprensa, Radio e TV e trabalhos publicados no Reino Unido, Irlanda, Grécia, Canadá e Brasil além de Portugal
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