MotoGP, 2020: Rossi, o começo do fim?

Por a 30 Novembro 2020 13:00

Será que a ida de Valentino para a Yamaha Petronas o vai prejudicar? Ou pelo contrário, será o ambiente fértil para um ressurgimento?

“Afinar a moto, aprendes.. se não sabes cumprimentar o mecânico, estás entalado!”

Graziano Rossi

Em teoria, a despromoção de Valentino Rossi em 2021 da equipa Yamaha de fábrica para a satélite Petronas é uma despromoção, mas pode bem acabar por não ser o caso.

Depois de 21 anos como piloto de fábrica, a começar nas 125 na Aprilia, (abaixo, nas 250) depois na Honda nas 500 e MotoGP, e Yamaha e Ducati já na era das 4 tempos, o sete vezes campeão do mundo de MotoGP Valentino Rossi passa finalmente a uma equipa independente em 2021.

Mesmo sem a terrível época que Rossi enfrentou em 2020, tinha que acontecer, claro. O tempo não perdoa, nem mesmo para um sobredotado como Rossi.

As opções eram a reforma ou contentar-se com uma equipa menos exigente que as formações oficiais. Veja-se como Dovizioso, após 3 vice-Campeonatos e ser praticamente o único a bater Márquez taco a ataco, foi preterido na Ducati este ano.

No caso de Rossi, o seu tempo no topo durou mais do que praticamente qualquer outro piloto, com duas décadas de sucesso a estenderem-se até para lá dos seus 40 anos, inédito nestes dias em que os pilotos começam a carreira aos 4 ou 5 anos (Mir teve um começo considerado tardio aos 10!) e a acabam pouco depois dos 30- milionários, ou cheios de equimoses, às vezes, como no caso de Michael Doohan, ambas.

Agora, resta ver se a mudança de Rossi para a Yamaha Petronas SRT é realmente uma despromoção. Pelo lado bom, o seu contrato mantém-se com a Yamaha, por isso é um piloto de fábrica, mas foi colocado numa equipa satélite.

Rossi terá à disposição em 2021 uma YZR-M1 totalmente de fábrica, mas eventuais atualizações irão para Maverick Viñales e Fabio Quartararo da Yamaha Monster de fábrica primeiro.

Ainda há que ver se isso é uma desvantagem ou poderá até, ser uma vantagem.

Este ano, vimos como Morbidelli, o piloto mais vencedor no final da época, quando a Yamaha perdeu o rumo, era o único dos quatro numa YZR-M1 de especificação A, um modelo de 2019 atualizado.

Primeiro, na era da telemetria, a ideia de que qualquer peça que se instale virá trazer uma melhoria instantânea é falaciosa. A recolha de dados e a sensação do piloto, de que Miguel Oliveira tanto fala, têm de se conciliar primeiro, para depois se avançar.

Depois, normalmente quando se melhora numa área, piora-se noutra. Por exemplo, dar mais tração carregando a traseira, inevitavelmente descarrega a frente e dificulta a inserção em curva… ou não, dependendo de como se chega lá!

Durante anos, a força da Yamaha era a sua docilidade em curva, que a tornava acessível a pilotos recém-chegados, quando as V4 da Ducati, Honda ou KTM mordiam… como Zarco e Lorenzo descobriram à sua custa.

Os novos Michelin vieram alterar isso, porque eram mais rígidos e tiravam sensação à moto…

Em 2020 chegou um traseiro mais aderente… que teve o condão de fazer as quedas passar a ser de frente, ainda pior.

Para a Yamaha, a incompatibilidade teve uma solução que pode parecer estranha, mas era fácil: regressar ao chassis de 2019…

É preciso ver que, dado um qualquer início de época, a moto do ano anterior está a funcionar muito melhor do que a nova, inicialmente… não é à toa nem para perder tempo com nostalgia que os pilotos começam por andar nas duas em sucessão ao longo de sessões de treino… só que, em teoria, ao incorporar na moto nova o que funcionava melhor na anterior e tentar descartar os pontos menos, a nova versão tem o potencial para ir mais além, à custa de muito desenvolvimento…

Aqui reside a força das satélite, como a Petronas SRT, pois as suas motos mantiveram-se praticamente inalteradas e funcionam do zero.

Até porque a política das fábricas é desenvolver a moto com a sua equipa oficial e deixar a satélite numa moto de especificação mais antiga e teoricamente inferior. Isto tem a dupla vantagem de esconder quaisquer erros inicias do escrutínio embaraçoso dos meios e de pessoal externo à fábrica e manter a equipa oficial, em teoria, um passo à frente.

Só que, por outro lado, as motos com um ano dadas à Petronas têm uma temporada completa de desenvolvimento em cima, mais dados de uma temporada completa de como funcionam em cada pista.

Especialmente para um rookie, que não tem a versão de fábrica como termo de comparação, isto pode ser uma grande vantagem. A equipa afina-lhe a moto e ele só se preocupa em andar rápido.

Depois, há valor na consistência. Como se viu com Viñales esta ano, ou Quartararo no fim da época, quando se muda muita coisa, há o risco de perder o rumo.

Ficou na história como em 1992, Rainey reverteu da Yamaha de fábrica para um quadro ROC – basicamente, cópia da moto de fábrica do ano anterior – para melhor lidar com as investidas da Suzuki de Schwantz.

Faz sentido que reverter ao que é familiar ajude a confiança do piloto, por isso quanto mais se anda sem mudar a configuração, mais confiança se tem na moto e melhores os resultados.

Quando se deita fora esse conhecimento íntimo com um novo chassis ou configurações muito diferentes, recua-se no desempenho e na confiança… seguem-se quedas, e menos confiança ainda, como me disse uma vez Alex Barros!

Depois, em termos pessoais, Rossi sempre deu grande importância às relações humanas… numa entrevista com o pai Graziano que fiz há uns anos, o progenitor atribuía um dos pontos fortes de Valentino a área pouco explorada, quando me disse, verbatim:

“Afinar a moto, mais cedo ou mais tarde, aprendes.. se não sabes como cumprimentar o mecânico de manhã, estás entalado!”

E Rossi sabe cumprimentar o mecânico de manhã, à tarde e à noite. Por ele, as tripulações, que o adoram, passam noites em claro a reconstruir uma moto para ele poder vencer no dia seguinte, se for preciso.

Depois, apesar da sua enorma fortuna, Rossi permanece simples e humilde. Dispensa o tratamento VIP das equipas de fábrica, a excessiva adulação dos fãs e ter quase de se esconder para levar uma vida normal. Por isso, e também para melhorar o seu Inglês, viveu em Londres entre 2000 e 2007, porque passava despercebido.

Para quem não sabe, estar numa equipa de fábrica é stressante… acreditem ou não, o coordenador emite todos os dias um memorando a dizer a cada membro da equipa que roupa usar ao jantar para todos coincidirem.

Portanto, estar numa equipa mais descontraída, como menos burocracias e menos exigências fora da pista vai ser bom para Valentino.

Como vimos, se um piloto estive relaxado, ajuda a confiança e confiança é o que vence corridas. A última vez que olhei, tinha o mesmo número de mãos e dedos que Miguel Oliveira e ando de moto há mais 25 anos do que ele.

A diferença é que ele acha normal entrar numa curva a 240 com a frente a escorregar e eu acharia assustador. Confiança.

Se a Petronas rodear Rossi do ambiente certo, o Italiano, que terá 42 anos no começo da época que vem, ainda pode gozar de um ressurgimento que encantaria os seus muitos fãspor todo o mundo.

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Paulo Araújo
Jornalista especialista de velocidade, MotoGP e SBK com mais de 36 anos de atividade, incluindo Imprensa, Radio e TV e trabalhos publicados no Reino Unido, Irlanda, Grécia, Canadá e Brasil além de Portugal
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Barbosa 914050416
Barbosa 914050416
4 anos atrás

O acaso de Rossi já vem de alguns anos. Ele devia já ter abandonado o MotoGP, pq a nossa geração de pilotos está á frente dele.

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