Técnica MotoGP: 1 – A Honda RC213V

Por a 18 Agosto 2019 15:30

Começámos pela Honda porque lidera o Campeonato e tem dominado a MotoGP desde 2013, sendo a exceção a vitória isolada da Yamaha em 2015 com Jorge Lorenzo.

A RCV foi obrigada pelas regras que determinam 4 cilindros e até 1000cc de capacidade para um peso máximo de 158 Kg, a reverter para esse formato, sendo originalmente um V5. Nos anos anteriores, o motor lutava com falta de potência, e logo aceleração, especialmente em relação às Ducati. Para 2019, apareceu com mais potência, estimada agora em cerca de 250 cavalos às 16.000 rpm, o que permitiu a Márquez vencer mas caindo muito menos que anteriormente, ou seja, arriscando menos.

Como sempre quando se consegue um incremento de potência, voltam a descobrir-se lacunas na ciclística, que volta a torcer sob a força da potência a ser passada ao chão pelos pneus, e para contrariar isso, a Honda usou a partir de Brno um quadro com  reforços estratégicos de carbono em certas zonas das vigas principais.

As adições em carbono são visíveis, adicionalmente Lorenzo usa apoio suplementar na curva do depósito

O que se pretende idealmente não é um quadro totalmente rígido e livre de flexão, que “empurraria” demais os pneus, mas flexão controlada, de preferência longitudinal (em linha com as rodas) mas não transversal (em que as rodas desalinhariam sob a torsão do chassis, com qualquer dono de uma Vespa já sentiu ao curvar)

Depois, ganha a luta peça procura de mais potência, fica a luta eterna sobre como a colocar no chão da forma mais eficiente. Aqui, os gostos, talento e estilo de condução do piloto são a medida crítica: Alguns como Márquez, Viñales ou Petrucci preferem a traseira a escorregar, outros exigem total suavidade para manter alta velocidade em curva, como Lorenzo ou Quartararo. Se a moto tem dificuldades em providenciar isso, temos os problemas de adaptação observados este ano.

A forma de fazer a potência passar ao chão da melhor maneira (a que permita aceleração mais imediata conservando ao mesmo tempo ao máximo os pneus) é controlada por muitas variáveis:

A velocidade e razão do hidráulico de afundamento e retorno da suspensão, ângulo de direção, posição do pivot do braço oscilante e comprimento total deste, são logo à partida alguns, mesmo antes de estarmos a falar de misturas e carcaças de pneus, que tendem a levar a culpa de efeitos frequentemente causados pelo chassis e não pela borracha.

Neste momento, e Márquez é o primeiro a admiti-lo, para extrair o melhor da RC213V, o Espanhol tem de usar ângulos de inclinação incríveis, que chegam a atingir os 65 graus. Nesses extremos, derrapagem é praticamente uma constante e cair é extremamente fácil, o que quer dizer que basicamente ao longo de uma corrida o pequeno Catalão está mais perto dos limites – ou para lá deles! – do que qualquer outro, por isso vence e é o único a vencer com a Honda neste momento.

Márquez é dos mais severos do Campeonato nas travagens e para tal dispõe de discos Brembo de carbono. A tradicional relutância da Honda em utilizar soluções fora do seu espetro de empresas – A Showa para a suspensão e Nissin para as travagens- ilustra bem a superioridade da marca Italiana. No entanto, em situações de chuva os pilotos preferem discos de aço, que dão travagem mais linear e neste caso, a marca usa discos Yutaka de aço. Até a posição dos pedais tem influência na sensação do piloto com a moto e pode ser ajustada a seu gosto.

Só os pedais da RCV de Márquez são uma obra de arte

Do lado de Lorenzo, cujo estilo exige e beneficia de uma velocidade altíssima em curva, não cair da moto, literalmente, é uma consideração importante, por isso quer na RCV quer o ano passado na Ducati a equipa adaptou-lhe formas plásticas no depósito para lhe permitir agarrar-se melhor, sobretudo na fase de travagem e inserção em curva.

O seu descontrolo na Catalunha, quando confundiu pilotagem com bowling e eliminou 3 dos quatro principais candidatos ao título de uma assentada, mostra que ainda não estavam bem lá nessa fase. Exigindo ferocidade e uma técnica de mudar de direção repentinamente em vez de curvas suaves a alta velocidade, é improvável que a HRC mude de direção quando Márquez vence com a moto como ela está… e talvez a RC213V nunca venha a permitir a Lorenzo vencer… mesmo que Márquez lhe desse essa hipótese!

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Paulo Araújo
Jornalista especialista de velocidade, MotoGP e SBK com mais de 36 anos de atividade, incluindo Imprensa, Radio e TV e trabalhos publicados no Reino Unido, Irlanda, Grécia, Canadá e Brasil além de Portugal
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