MotoGP, história: A era de Doohan

Por a 16 Março 2020 16:00

A era de MotoGP tem sido de tal modo dominada por um trio de pilotos, Marc Márquez, Valentino Rossi e Jorge Lorenzo, que quase esquecemos o que veio antes.

De facto, desde 2019, de há 20 anos para cá, e com as honrosas exceções de Kenny Roberts Jr. e Nicky Hayden (uma vez) e Casey Stoner (duas vezes) os títulos da classe rainha foram praticamente monopolizados, primeiro por Rossi entre 2001 e 2009 (domínio interrompido, como vimos, por Hayden em 2006 e Stoner em 2007) e depois por Jorge Lorenzo, brevemente, em 2010, 2012 e 2015, antes do bulldozer Márquez levar tudo à frente, a partir de 2013 e sem interrupção desde 2016.

Antes destes, e olhando para trás duas décadas, houve um domínio semelhante, neste caso de um binómio homem/moto na pessoa de Michael Doohan e da poderosa Honda NSR500.

Há vários paralelos entre o poderoso Mick Doohan e Marc Márquez: o incrível talento para andar em derrapagem na borda dos pneus, o domínio do pneu dianteiro com “salvamentos impossíveis”, os recordes e marcos na classe rainha e o uso de jogos mentais para destruir e desmoralizar a oposição.

Doohan ainda é uma visita frequente ao paddock da MotoGP

conquistou o título consecutivamente cinco anos entre 1994 e 1998 e só não o terá feito em 1999 por se ter lesionado, deixando o Espanhol Alex Crivillé, montado na mesmíssima Honda NSR500, em posição única para ganhar nesse ano.

A herança de Doohan nos anos seguintes foi tal que o seu técnico-chefe, o também Australiano Jeremy Burgess, passou para Valentino Rossi na Honda, das 500 a 2 tempos para as 4 tempos de MotoGP, da Honda para a Yamaha, e ainda hoje, homens que vieram como ele do tempo de Doohan integram a Yamaha Monster de Rossi.

Doohan, um prodígio de talento natural de Brisbane, começou a correr na Austrália por acidente, literalmente, quando danificou a sua Yamaha LC350 num acidente de estrada e como jovem sem dinheiro, mas já com fama de “acelera”, aceitou correr por um concessionário Yamaha numa prova em troca do custo da reparação.

A dívida ficou paga quando nesse dia ganhou duas das 3 corridas que contestou em Oran Park e seguiu-se sucesso nas visitas do incipiente Mundial de Superbike à pista em 1988, com vitória nas duas mangas.Doohan foi contratado pela Honda e mantido como uma espécie de piloto “stand-by” ao duo de Darryl Beattie e Wayne Gardner.

Quando este foi emparelhado com ele para as 8 Horas de Suzuka em 1991, o resultado foi a vitória, mas já no final da época anterior Doohan tinha ganho nas 500 no Grande Prémio da Hungria.

Doohan em luta com Schwantz e Rainey

1992 podia ter sido o seu primeiro título Mundial, mas uma lesão grave no GP da Holanda quase o levou a perder uma perna por gangrena e o Campeonato foi para Rainey por… quatro pontos!

Regressado em 1993 com a perna ainda muito debilitada, Doohan será para sempre creditado com a adoção do agora comum travão traseiro de polegar, para substituir com a mão esquerda a perna ainda fraca demais para operar o travão traseiro.

Em 1994, a perna tinha sarado o suficiente para que nada se metesse no caminho do Australiano, que venceria o título por quase o dobro de pontos do segundo classificado.

Doohan, ou “Poderoso Mick” como já era apelidado então, apenas o segundo Campeão Mundial de 500 Australiano após Gardner, viria a bisar no título até 1998, e só outra lesão o afastaria prematuramente.

Em 1997, o seu ano de maior sucesso, Doohan venceu 12 das 15 corridas, terminou em segundo em mais duas, e caiu da última corrida da temporada no seu GP em casa, quando liderava por mais de seis segundos. Em Junho de 1996, Doohan foi inscrito como membro da Ordem da Austrália pela sua contribuição para o desporto motorizado.

O seu estilo feroz de derrapagem e condução na roda traseira tornou difícil a outros pilotos seguirem-no, dando ensejo a um ano em que outra marca conquistaria o Campeonato, até um jovem Valentino Rossi vir corrigir as coisas, numa NSR muito amansada e que, em breve, seria substituída pela RCV de quatro tempos.

Doohan permanece assim como o mais dominante dos pilotos da era das 500 ferozes e indomáveis.

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Paulo Araújo
Jornalista especialista de velocidade, MotoGP e SBK com mais de 36 anos de atividade, incluindo Imprensa, Radio e TV e trabalhos publicados no Reino Unido, Irlanda, Grécia, Canadá e Brasil além de Portugal
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