MotoGP, 2021: O efeito de solo na Ducati GP21… realidade ou ficção?

Por a 24 Abril 2021 17:00

A Ducati revelou o seu último avanço aerodinâmico nos testes do Qatar – a fábrica italiana está a usar o downforce para aumentar a aderência em curva, uma nova área de desempenho aerodinâmico na MotoGP?

John Barnard, o prestigiado engenheiro que introduziu o chassis composto de fibra de carbono e a caixa de velocidades semi-automática na F1, esteve há cerca de dez anos atrás ligado ao projecto ‘King’ Kenny Roberts’ do MotoGP, onde nunca teve os recursos para explorar as áreas de desempenho que realmente queria explorar. A aerodinâmica na MotoGP fascinava-o particularmente porque a ciência estava tão avançada na F1, mas nessa altura mal tinha sido abordada nas motos.

Os carros de F1 obtêm grande parte da sua espantosa velocidade em curva a partir da força descendente aerodinâmica, o designado efeito de solo, que utiliza baixa pressão entre o carro e a pista de corrida para sugar o carro para o asfalto, gerando enormes quantidades de aderência. Barnard já na altura pensava se poderia usar o efeito de solo para criar mais aderência no MotoGP.

A Ducati é o rei da aerodinâmica do MotoGP. Gigi Dall’Igna e os seus engenheiros de dinâmica de veículos passaram as últimas cinco temporadas a desenvolver um chassis que evitasse o wheelie – levantamento da roda da frente à saída de curva – para permitir ao piloto utilizar mais acelerador nas curvas de saída, e aumentar a estabilidade de travagem, permitindo ao piloto travar mais tarde.

O EFEITO DE SOLO DA DUCATI

O novo sistema de aerodinâmica experimentado nos testes do Qatar pela Ducati, sugere que a marca de Bolonha está agora a explorar outras áreas da aerodinâmica. A grande questão é esta: a Ducati está a perseguir o efeito de solo (pensado por Bernard) para aumentar a aderência em curva?

De facto, o motociclista e aerodinamicista de Fórmula 1 Ali Rowland-Rouse, acredita que a Ducati tem vindo a utilizar o efeito de solo desde 2019, quando pela primeira vez fixou as tampas das rodas à área inferior das rodas da Desmosedici. As coberturas das rodas fazem duas coisas”, diz Rowland-Rouse. “Primeiro, limpam o fluxo de ar à volta da roda em linha recta. Segundo, são dispositivos de downforce-at-lean-angle, porque quando se tem uma superfície plana perto do solo em velocidade, com o ar a passar entre as duas, baixa-se a pressão entre elas e acaba-se com a downforce”.

A maioria das motos de MotoGP são concebidas para produzir downforce quando a moto está direita. Superados os 45 graus de inclinação, passa a existir mais força lateral do que força descendente, o que aumenta a aceleração lateral através da curva, que é o que os pneus estão a lutar contra, pelo que as coberturas das rodas são dispositivos de força descendente que criam sucção quando a moto é inclinada.

A Ducati não utilizou as coberturas das rodas durante os testes do Qatar. Em vez disso, o piloto de testes Michele Pirro e os pilotos de fábrica Jack Miller e Pecco Bagnaia de 2021 testaram uma nova característica aérea na carenagem inferior da Desmosedici, algo nunca antes visto no MotoGP.

QUAL A FUNÇÃO DAS TOMADAS DE AR LATERAIS INFERIORES USADAS NOS TESTES DO QATAR?

A solução aerodinâmica da Ducati apresenta uma tomada de ar em cada lado da carenagem, fazendo com que o ar percorra ambos os lados da roda da frente, cercando-a quase a 90 graus e impulsionando-a para o solo. “Esta é a primeira vez que vemos tomadas de ar tão baixas e próximas da pista”, acrescenta Rowland-Rouse. “É uma conduta para baixo e em ângulos de inclinação elevada está muito perto da pista, pelo que produz força descendente”.

Jack Miller revelou que este sistema faz de facto a moto parecer mais estável, o que sugere que a Ducati está de facto a trabalhar nesta área. No entanto, Rowland-Rouse pensa que as condutas de ar podem ter um efeito maior em vários outros factores de performance. Segundo diz o bordo de fuga da asa média (entre a asa superior e a conduta para baixo) é mais alto do que o bordo de fuga, o que produz menor pressão sob a asa, sugando a moto para o solo. “O outro factor é que o fluxo de ar por baixo de uma carenagem de moto a alta velocidade é uma confusão. A roda da frente cria uma grande esteira, que cria ar turbulento e de baixa pressão sob a moto e um turbilhão de ar na traseira da moto, como um camião. Tudo isto cria um grande arrastamento. Assim, esta conduta de descida dispara ar sob a moto para aumentar a pressão do ar nessa área, o que reduz o arrasto.

Na apresentação da Ducati GP21 vemos a moto ainda sem o sistema, posteriormente experimentado por Jack Miller e Pirro nos testes do Qatar

“Isto tem dois efeitos. Não só reduz o arrastamento para aumentar a velocidade em linha recta, como também limpa o fluxo de ar na parte de trás da moto, o que torna mais difícil aos pilotos que vêm atrás aproveitarem a sucção da Ducati”, e consequentemente, ganharem velocidade. .

Na verdade, o desenho geral da carenagem da Ducati está mais elegante do que no passado mais recente, e por isso, em vez de se concentrarem na força descendente como nas temporadas mais recentes, o que parece é que os técnicos da Ducati estão a aprimorar  as coisas, para reduzir o arrasto e aumentar a velocidade máxima.

MAIS FABRICANTES VÃO SEGUIR O ‘EFEITO DE SOLO’?

Será que as últimas concepções aeronáuticas da Ducati irão encorajar mais protestos de fabricantes rivais? Ainda não sabemos, porque a fábrica ainda tem de homologar o kit. 

O que sabemos é que a Ducati é o único fabricante de MotoGP que quer continuar o desenvolvimento aerodinâmico ao ritmo atual. Há dois anos – após a controvérsia sobre o chamado refrigerador de pneus traseiros da Ducati, Gigi Dall’Igna estava interessado em aprofundar o conhecimento aerodinâmico, enquanto a Aprilia, Honda, Suzuki e Yamaha concordaram que não queriam que esse desenvolvimento prossegui-se, enquanto a KTM queria que todos os dispositivos aeronáuticos fossem proibidos.

“A nossa opinião é que queremos desenvolver tecnologia que possa ser transferida para as motos de rua, razão pela qual a aerodinâmica extrema não é o caminho certo”, disse na altura o director técnico do HRC, Takeo Yokoyama.

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