MotoGP, 2020: As causas do sucesso da Yamaha Petronas

Por a 26 Outubro 2020 13:00

Até agora a Yamaha Petronas SRT, apesar de ser uma formação satélite a lutar contra 6 fábricas, venceu quase metade das corridas disputadas em 2020… Como pôde isso acontecer?

Quando uma equipa satélite, a três corridas do fim do Campeonato, venceu praticamente metade dos grandes prémios disputados até agora, cinco de onze, com os seu dois pilotos, tem que se fazer a pergunta como e porquê.

As respostas são várias, e repartem-se por três áreas: A nível  financeiro, técnico e, muito especialmente, humano.

É útil traçar a história das origens da equipa para percebermos o contexto: a Petronas começou o seu envolvimento no mundial de motociclismo em 2015 nas moto3, como uma formação que pretendia trazer pilotos malaios para o Mundial.

A formação expandiu para as Moto 2 em 2017, e finalmente, estreou-se no Moto GP o ano passado, em 2019.

Amplamente financiada pela petrolífera Malaia Petronas, que considera estratégico o envolvimento no motociclismo, em vista da recente fascinação dos jovens do pais Asiático de 32 milhões de habitantes pelas motos e pela competição, a formação dirigida por Razlan Razali tem à sua disposição um dos maiores orçamentos de MotoGP, segundo alguns boatos, maior mesmo que algumas das equipas de fábrica…

Portanto, a parte financeira, que provavelmente se situa num pacote total à volta dos 30 milhões de dólares, está assegurada… Se esta soma parece extravagante, lembrem-se que a Petronas veio de patrocinar a Mercedes na Formula 1, onde os números são assustadores.

Há também que levar em conta que, já em 2012, a contribuição de Petronas para a Yamaha de fábrica, na altura com Jorge Lorenzo e Ben Spies como pilotos, era de 8 milhões de dólares.

Com uma moto de fábrica a custar cerca de 2,5 milhões de dólares, a equipa foi assegurada de equipamento praticamente igual ao de fábrica, aparentemente, ao contrário da aventura anterior da Yamaha com a Tech 3, onde Hervé Poncharal nunca sentiu que tinha equipamento à altura, ou pelo menos idêntico ao de fábrica.

Esta opinião parece ser agora confirmada pelo facto de que, após a mudança para a KTM, a equipa já venceu com Miguel Oliveira.

Temos, portanto, até agora, um orçamento praticamente ilimitado e acesso ao melhor material de fábrica, duas coisas importantes, fundamentais mesmo, para o sucesso de uma equipa a este nível.

O outro, como dissemos, situa-se a nível de recursos humanos, quer no pessoal técnico, quer na escolha de pilotos.

Em termos do pessoal da equipa dirigida pelo ex-piloto Sueco Johann Stigefelt, ao embarcar na aventura da MotoGP, a equipa foi buscar à Yamaha Monster oficial o também ex-piloto das 250 e coordenador da Yamaha Wilco Zeelenberg, holandês que trabalhava com Maverick Viñales, e ao mesmo tempo, o chefe de mecânicos Ramon Forcada, com décadas de experiência ao lado de pilotos como Jorge Lorenzo ao longo de vários títulos mundiais.

O lado técnico estava portanto também assegurado ao mais alto nível!

Depois, os pilotos da equipa foram anunciados como Franco Morbidelli, que vinha afinal com o título de Moto2 de 2017 no bolso… e, na altura considerado um risco calculado, preferido sobre a opção de Álvaro Bautista, o jovem francês Fábio Quartararo.

Após fazer uma série de poles e liderar corridas em 2019 no seu, e da equipa, ano de estreia na classe rainha, sem no entanto nunca ter vencido, Quartararo acabou em 5º no mundial, contra o 10º de Morbidelli.

Razlan Razali deve ter lamentado as palavras proferidas na apresentação da formação quando disse que “não fazia sentido gastar dinheiro em duas motos oficiais quando Quartararo tinha que aprender e habituar-se à classe no seu ano de estreia”.

O Francês de Cannes, há muito residente em Espanha, habituou-se tão bem que este ano é o piloto com o maior número de vitórias, três, e a dada altura, até à oitava corrida, e no ano com mais vencedores diferentes de que há memória, era o único que tinha vencido mais de uma vez.

Na 6ª corrida em Misano, Franco Morbidelli juntou-se a ele ao vencer o GP de San Marino, e com a última em Teruel, completou as cinco vitórias dos dois pilotos da Petronas Sepang até agora, tornando a formação a equipa mais vencedor em 2020, e agora com dois sérios candidatos ao título em jogo:
Quartararo tem vindo a liderar o Mundial e está agora segundo, e Morbidelli em quarto, ambos ao equivalente de uma vitória em pontos do líder Joan Mir, portanto um resultado que pode ser invertido em qualquer altura…

Depois, a entrada de Valentino Rossi na equipa para 2021, infelizmente por troca com a estrela Quartararo, que vai para a equipa oficial, demonstra a continuada liquidez da equipa, pois além do mais, Rossi conseguiu trazer para a equipa para o ano o seu técnico chefe David Muñoz, o homem da telemetria Matteo Flamigni e o seu treinador pessoal Idálio Gavira.

A troca em si também fala volumes da capacidade financeira da formação, porque embora seja natural que Rossi, em fim de carreira, tenha aceite uma redução de seu substancial salário, continua a ser improvável que se situe muito abaixo dos 8 milhões de dólares, que é, por si só , mais do que outras equipas da traseira do pelotão têm para gerir o seu esforço o ano inteiro.

Por contraste com os 1,5 milhões de Quartararo, ( que provavelmente serão dobrados para 2021), implicam um incremento das despesas de Razali.

Outro fator completamente intangível mas que muitos dizem ser importantíssimo, é o bom ambiente familiar que se goza na equipa.

A pressão de uma equipa de fábrica, (e a Ducati vem imediatamente à mente) é constante e por vezes esmagadora.

Entre os pilotos e pessoal, a rivalidade de um para o outro lado da garagem pode ser feroz, há críticas e perguntas quando o piloto passa por um período sem fornecer resultados consistentes e despedimentos quando ele não o faz, como vimos com Petrucci e com o próprio Dovizioso, que ainda está em contenção para o Campeonato e chegou a liderá-lo, mas mesmo assim foi despedido de formação de Bolonha.

Por contraste, a equipa de Stigefelt e Razali, com 56 empregados de 12 nacionalidades, goza de um ambiente familiar, em que todos estão à vontade e se sentem acarinhados e encorajados nos seus diversos papéis.

A chegada de Valentino Rossi, se decerto se já não garante resultados, continua mesmo assim a ser um golpe mediático para a formação maláia, pois Rossi tem provavelmente mais fãs no país Asiático do que em qualquer outro exceto a sua Itália Natal… e que extraordinário seria se a equipa fosse para 2021 com o título de MotoGP, o primeiro de que há memória de uma equipa satélite no campeonato!

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Paulo Araújo
Jornalista especialista de velocidade, MotoGP e SBK com mais de 36 anos de atividade, incluindo Imprensa, Radio e TV e trabalhos publicados no Reino Unido, Irlanda, Grécia, Canadá e Brasil além de Portugal
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