Moto GP – Miguel Oliveira fala da época passada e da estreia em MotoGP

Por a 17 Dezembro 2018 15:00

Em 2018, Miguel Oliveira foi o único piloto nas 3 categoria de MotoGP que nunca caiu e lutou pelo título até ao fim com o eventual Campeão numa moto menos desenvolvida. Fomos ouvir o que o nosso único homem no Mundial e primeiro português a ingressar na Categoria de MotoGP tinha para dizer a propósito.

Foi uma época que me encheu de alegria, o vice-campeonato deixa-me feliz, pois as posições de partida não eram sempre as melhores e houve situações em que as coisas podiam ter corrido de outra forma mas sempre terminei todas as corridas dentro dos pontos, e dos pódios, em 18 possíveis falhei 6, portanto consegui 13 pódios (na verdade foram 12, n. do a.) e 3 vitórias (Itália, Checa e Valência, n. do a.) e fico com boas memórias deste campeonato. É lógico que ter sido vice-campeão por nove pontos de alguma forma sabe a pouco, mas fico contente de realmente ter feito uma grande última temporada de Moto2, não só esta última temporada, mas também em 2017, pois entrámos com muita ambição neste projeto da KTM de Moto2, com uma moto nova. Conseguimos em curtos dois anos fazer dela uma moto que ganhou várias corridas, comigo e com o meu colega de equipa conseguimos ganhar 9 corridas em 2 temporadas, face à competitividade dos outros construtores e das experiência que eles tinham, valoriza ainda mais as conquistas deste ano, e para mais este ano conquistamos o Título de Campeões por equipas à KTM Red Bull. Também vale a pena recordar que tivemos um Campeão muito forte, com muitas vitórias, portanto nesta temporada não foi suficiente ser regular no pódio, teria de ser regular a ganhar…

Há 25 corridas que não cais, desde 2017 na Áustria, qual é o segredo para não cair e andar à frente?

Eu sou um piloto muito calculista e isso faz-me terminar as corridas nos pontos. É lógico que o risco que eu corro é sempre medido, a maior parte das quedas que tive este ano também foram na qualificação, fruto de tentar andar um pouco mais rápido e arranjar uma melhor posição de saída. Aqui não há outro segredo senão isso, faz parte do meu estilo de condução, da minha pilotagem, só forço a moto ao limite quando estou confortável. Não sou daqueles pilotos que caem sem motivo, mas isso também não é indicador de nada, o Marquez cai muitas vezes e é Campeão, não é indicador de se estar num bom ou mau caminho.

Se analisarmos a época um pouco mais ao pormenor, conseguimos ver que quando chegávamos em terceiro ou segundo e alguém acabava à nossa frente, eram só as motos do Team Sky, portanto atribuir aqui a falta de performance de 2/10 inteiramente à moto é a meu ver errado, pois o Team Sky foram os únicos que em alguns momentos conseguiram fazer a diferença, ter uma moto performante em condições em que a nossa tinha dificuldades… Obviamente que a moto aqui faz muita diferença, pois num Campeonato tão competitivo como o nosso, duas décimas por volta são muito valiosas e essas 2/10 por vezes só se conseguem encontrar mesmo a nível da afinação e nós revelámos alguma juventude no projeto em certos ambientes…

“a nossa estratégia foi sempre encontrar um equilíbrio para a moto em corrida”

As dificuldades na qualificação são uma questão que até por nós era muito abordada, é lógico que a qualificação é aquela sessão em que se leva tudo um pouco mais ao limite, as condições de aderência também são outras… quando tínhamos muita borracha dos pneus da Michelin em pista e altas temperaturas, dava um grip muito maior e tivemos alguma dificuldade em fazer a moto funcionar nesse ambiente…  era difícil por vezes encontrar uma moto equilibrada e estável e trabalhámos toda a temporada numa moto de picos e extremos e portanto tentámos não cair para nenhum dos lados e equilibrar as coisas, a nossa estratégia foi sempre encontrar um equilíbrio para a moto em corrida, cruzar os dedos e esperar pelo melhor…

Eu queira fechar a categoria com chave de outro e saí com uma vitória em Valencia, queria também demonstrar que, apesar de não ter sido o Campeão levava uma vantagem, levava última vitória comigo, também a última vitória da era com os motores Honda na Moto2, portanto fechámos em beleza esta temporada…

Quanto à passagem para a MotoGP, quando experimentei a RC16 em 2017 foi um presente, andámos tal e qual como ela estava sem mudar nada, e desta vez foi uma experiência mais real, no teste depois da última corrida em Valencia acabei por andar mais a sério e absorver todas aquela sensações de rodar com uma MotoGP… foram dois dias muito estranhos para mim, de sensações novas, caras novas dentro da boxe, pois a equipa também ela era nova para mim, portanto houve que adaptar-me a tudo e “voltar à escola”, a aprender como se anda numa moto daquelas…

“já tenho algumas coisas que sinto na moto e dou o meu feedback à equipa”

A moto é muito diferente, até pela quantidade de eletrónica, mas isso é o menos, a questão dos botões ultrapassa-se facilmente, é o mal menor da moto… é lógico que passei dois anos na Moto2 e agora é uma moto que não tem nada a ver… e quando digo não tem nada a ver, é tudo, a nível da potência, aceleração, velocidade, potência da travagem, eletrónica…

Em Jerez a equipa já conseguiu encaixar um pouco mais da moto ao meu estilo de condução, apesar de que eu ser um estreante já tenho algumas coisas que sinto na moto e dou o meu feedback à equipa e têm sido melhoradas … a equipa pelo seu lado já entende melhor a moto, os pontos fulcrais e como eu gosto de conduzi,r apesar de ser uma moto muito diferente, tem duas rodas e acelera e trava como as outras e portanto existem aqui uns requisitos básicos. É nisso que agora equipa tem trabalhado, eu também preciso destes pequenos ajustes…

A seguir em Sepang já vão ser uns testes mais a sério, pois nós mudámos toda a estrutura daquilo que era a  nível de material de um dia para o outro a equipa trabalhou com uma marca de um construtor japonês, julgo eu quase 20 anos e de repente teve de trocar tudo, mesmo a nível de ferramenta e software eletrónico, as coisas são todas diferentes, e a equipa agora está a usar este mês de Dezembro para trabalhar a reconstruir a moto, prepara tudo para Sepang para começarmos os nosso teste com a estratégia apenas de nos primeiros dias tirar o pó destes meses de inverno e refazer o que é o trabalho de habituação à moto…

É evidente que trabalhar com um chefe de mecânicos como o Guy Coulon é algo extremamente positivo, que me deixa muito contente, o facto de ter vindo para este projeto com ele ao lado, e não só ele mas toda a estrutura da Tech 3, é um técnico que apesar de ter muita paixão pelo motociclismo tem muita experiência que podemos usar para desenvolver mais a nível técnico…

Quanto ao número 88, eu tinha de mudar porque há outro piloto na MotoGP que o usa, e pensei, como na MotoGP tudo é a dobrar, o dobro da potência, etc., multiplicar por dois o 44, continua a ser um número par…

“neste momento sabemos que a moto é uma moto para estar entre 15º e 10º”

Obviamente que ao passar para a MotoGP, neste momento sabemos que a moto é uma moto para estar entre 15º e 10º, é a realidade nestes últimos dois anos, embora eu espero dar um passo em frente, mas claro que a médio prazo quando tiver a moto a um bom nível, passa pelos meus planos ser Campeão de MotoGP…

Quanto aos restantes pilotos da categoria já não tenho ídolos, quando muito o meu ídolo sou eu daqui a 4 ou 5 anos… já lido com estes pilotos no paddock há muito anos na minha carreira no mundial, alguns talvez tenha alguma admiração por eles e outros nem tanto, mas acabam por ser todos rivais, todos queremos o mesmo…

A equipa entende a nossa situação, é uma equipa estreante com um piloto estreante, estar na MotoGP só por si já é difícil, fazer bons resultados ainda mais, mas a equipa entende que neste momento o mais importante é construir uma boa moto, e não estar a pensar nos resultados… o resultado virá por si só com o bom trabalho que nós faremos ao longo da época…

Seria bom ter o título de melhor rookie ao fim do ano, embora não me encha o ego ou dê a isso grande significado, não é um prémio que considere muito relevante, mas é evidente que quereria dizer que, dentro daqueles que se estrearam fomos os que trabalharam melhor… estamos a lutar com meios muito diferentes das outras equipas que por terem a mesma moto há vários anos estão a outro nível de experiência e isso faz com que seja complicado lutar com a mesma ambição que eles têm…

No MotoGP os tempos de travagem fazem bastante diferença, aqui para colocar a moto no sítio certo para travar é muito importante utilizar o travão detrás… os pneus não notei ainda grande transição, tenho pouco feedback da dianteira e nestes três testes andei sempre com o mesmo tipo de pneus e torna-se difícil arranjar algum método de comparação, quando andei só com esses pneus… apesar de o mais importante ser preparar bem a moto e confiar na equipa. Já passei por equipas em que falava espanhol, inglês, agora vai ser a vez de falar Francês…

A outra coisa que mudou é a atenção mediática, o número de perguntas que os jornalistas fazem, a sério, há muito mais interesse, estar na MotoGP é outro nível, a curiosidade que surge em volta do tipo de moto que é…

 

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Paulo Araújo
Jornalista especialista de velocidade, MotoGP e SBK com mais de 36 anos de atividade, incluindo Imprensa, Radio e TV e trabalhos publicados no Reino Unido, Irlanda, Grécia, Canadá e Brasil além de Portugal
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